sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Um pouco de história: Fender Stratocaster Southern Cross


Continuando com as postagens do blog, ressaltando a Fender brasileira que nesse ano completou 22 anos de seu projeto e fabricação: a Fender Southern Cross. Assim, vamos abordar um pouco sobre a série fabricada no Brasil pela Giannini de 1992 a 1995, sob supervisão da Fender e coordenação de Carlos Assale, mistérios, lendas, curiosidades e opiniões sobre o instrumento.

Em meados dos anos 1990, a Giannini (conhecida fábrica brasileira por produzir instrumentos musicais para o mercado interno e exportação), obtém licença para a fabricação do projeto Southern Cross. O que parecia um sonho ou ideia inicial se torna viável através da parceria com a lendária matriz americana, cujo objetivo era ter um fornecedor de violões tradicional, a quem pudesse confiar essa linha de instrumentos. No mesmo ano, Assale interrompe seus trabalhos na fábrica da Dolphin e é convidado por Giorgio Giannini para assumir a direção técnica da empresa, bem como desenvolver e tornar possível o projeto Fender no Brasil. Ainda que o mercado de instrumentos musicais no país estivesse em baixa no início dos anos 90 e em razão de uma economia instável e duvidosa, construir uma Fender no Brasil representava muito mais que um simples desejo da empresa, mas abria a possibilidade de expandir mercado e conquistar os músicos consumidores brasileiros, cansados de importar seus instrumentos produzidos especialmente nos Estados Unidos, Japão e Coréia. O trabalho inicia em 1991 onde pequenas amostras eram construídas e aperfeiçoadas com o objetivo de enviá-las para aprovação. Em pouco tempo o braço foi aprovado, o corpo do instrumento levou em média dois anos e muitas amostras com madeira do tipo Cedro Rosa e testes com o shape do instrumento foram feitos, desenvolvendo tecnologia para a construção ideal da guitarra. Sabe-se que a Fender é detalhista, obsessiva e dedicada ao shape da Stratocaster, tornando parte de sua marca registrada, justificando os cuidados e medidas necessárias por parte dos funcionários da empresa, e em especial, por Carlos Assale. Após toda a insistência por parte dos brasileiros, Dan Smith, diretor de marketing da Fender, envia um documento declarando que o produto tinha melhorado, autorizando que a guitarra fosse produzida fora de suas fábricas em território americano e assim ostentasse o nome Fender no headstock, causando euforia aos representantes envolvidos no projeto. Foi então que a produção começou. 

Os lotes fabricados entravam no mercado brasileiro depois que um representante da Fender viesse fazer a tal "minuciosa inspeção". O controle de qualidade era bastante rigoroso: as guitarras eram pesadas, medidas e inspecionadas, após a confirmação dos resultados, os instrumentos estavam prontos para os consumidores brasileiros. Foram produzidos ao todo cerca de 5000 instrumentos de 1993 a 1995, quantia relativamente baixa em razão do pequeno período de três anos, tornando a Southern Cross objeto de admiradores: colecionadores e músicos encontram dificuldades, por exemplo, de encontrar um exemplar que esteja original ao lançamento de fábrica, ou até mesmo, com o logotipo intacto “Made in Brazil” preservado no headstock. Muitos vendedores em meados dos anos 2000 lixavam a inscrição com o objetivo de enganar consumidores, alegando que o instrumento era importado e assim aceleravam as vendas pela internet, alegando ser uma Fender autêntica, e não uma construída pela Giannini.


A desvalorização era tanta, que muitos a tratavam como Giannini e não como Fender, devido grande preconceito de ter sido produzida nas instalações da fábrica brasileira. Infelizmente, algumas coisas no Brasil tendem a não dar certo e, em meados de 1995, a produção foi cancelada porque as peculiaridades econômicas do país somadas ao royalty muito alto tornaram o projeto economicamente inviável, sendo assim, a empresa não obteria lucros considerados esperados a menos que aumentassem consideravelmente o valor dos instrumentos, quebrando com o principal objetivo do projeto: um instrumento que apresentasse alta qualidade com preços dentro dos padrões de mercado brasileiros. 



A Giannini deixou de fabricar a Fender Stratocaster Southern Cross, devido aos altíssimos royalties pagos à matriz norte-americana, e deu continuidade no mesmo período a nossa velha conhecida Giannini Stratosonic, que era apenas uma sombra baseada no projeto inicial da Southern Cross. Quem já teve a oportunidade de ter uma delas sabe que perdem em qualidade, acabamento e construção, comparando a Fender brasileira dos primeiros lotes (principalmente se comparadas as que saíram com o selo Squier Series). Atualmente, alguns vendedores ou músicos se equivocam em afirmar que a Southern Cross e as stratos Giannini são a mesma coisa, pois apresentam características completamente diferentes ao que se refere construção, acabamento e shape dos instrumentos, embora as madeiras utilizadas fossem as mesmas: Cedro e Marfim Imperial. 



O principal fator negativo alegado por pessoas conhecedoras e proprietários do instrumento, é que algumas unidades construídas no último ano de fabricação apresentaram alguns detalhes que às tornam inferiores ás primeiras produzidas, fato que pode ser facilmente confirmado observando as inúmeras fotografias na internet e comparações com o recorte e acabamento da madeira do braço e corpo do instrumento. Além disso, já tive a oportunidade de testemunhar uma Southern do lote de 1995 que tinha o braço em Marfim com a escala colada, isso mesmo.. nada igual as primeiras que eram de uma única peça (one piece). PS: Aqui mesmo no blog, tem outro post abordando melhor o fim da parceria com a Fender e mostrando um pouco do que encontrei das diferenças de construção dessas guitarras.




Imagens tiradas de uma Southern Cross customizada de minha coleção, essa acabei vendendo a alguns anos atrás, para poder investir em uma Fender Stratocaster americana.

Linha do tempo:


1989: Último ano de Carlos Assale no comando da Dolphin;

1990: Carlos Assale assume o comando da Giannini;
1991: (Janeiro/Junho) Viagem para os USA, apresentações em Corona e contrato com a Fender;
1991: (Julho/Dezembro) Primeiras amostras e tentativas de reprodução do shape Fender;
1992: (Janeiro/Junho) Ajustes finais e organização da estrutura na fábrica para início da produção;
1992: (Julho/Dezembro) Início da produção 1º lote (sem vendas)
1993: (Janeiro/Junho) Início das vendas com selo "Squier Series" (1º lote);
1993: (Julho/Dezembro) Vendas do 2° lote (ainda com o selo "Squier Series);
1994: (Janeiro/Junho) Substituição do selo "Squier Series" pelo selo "Southern Cross" (1º lote);
1994: (Julho/Dezembro) 2° lote de vendas da Southern Cross.
1995: (Janeiro/Junho) Perda significativa na qualidade de construção + falta de padrões + altos encargos + royalties + funcionários insatisfeitos.. etc..
1995: (Julho/Dezembro) Fim da parceria;




William de Oliveira

18 comentários:

  1. Olá William.

    Onde vc obteve essa cronologia da SC? Sobretudo a parte "1994: (Janeiro/Junho) Substituição do selo "Squier Series" pelo selo "Southern Cross" (1º lote);"?

    Nem a Giannini soube me informar com essa precisão.

    Abraços

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    1. Olá Sérgio, obrigado por sua pergunta, pois eu precisava esclarecer isso. Essa cronologia foi uma constatação à partir do relato de muitas pessoas: compradores da época, opinião de colecionadores, minha pesquisa/curiosidade pela Southern Cross e dos poucos registros feitos pelo próprio Carlos Assale. A parte que você questionou se deve ao fato da transição do selo "Squier Series" para o selo "Southern Cross" ter ocorrido no início de 1994, nessa época não se utilizava mais o selo "Squier Series", já tinham substituído pelo selo "Southern Cross".

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    2. Olá. Tenho uma Southern Cross com o selo Squier comprada em janeiro de 1994 (sou o único dono). Provavelmente foi produzida ainda em 1993. A madeira e as ferragens são boas. O problema são o acabamento e a qualidade dos captadores - muito fracos. O braço dela veio fora de centro, inclinado para cima e com uma folga na junção do braço com o corpo (foi meu primeiro instrumento e não tinha noção do problema quando comprei). Levei ela para o luthier Márcio Zaganin, que colocou um calço na junção e centralizou o braço. Ele também substituiu os captadores originais por captadores texanos Rio Grande, enrolados a mão. O som ficou absurdo! Posteriormente, substitui as tarrachas por tarrachas Schaller com trava. Fora essas mudanças ela está totalmente original, inclusive com todos os decalques. Atualmente uso a guitarra para tocar em bares com minha banda e posso dizer que é um instrumento digno. Mas não dá para comparar com minha trato americana em hipótese alguma. Medidas, acabamento, peso... tudo diferente.

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    3. Pois é Alexandre, infelizmente a sua saiu muito ruim e é um caso a parte, digo isso porque as que vinham com o selo Squier Series eram melhores construídas, por pertencerem aos primeiros lotes. Pelo fato de ter comprado em 1994, significa apenas que a loja demorou a vender, talvez por ter vendido anteriormente outras que tinham em estoque. O hardware dela realmente é ruim e vale dar um upgrade, que bom que o amigo já fez! É isso, abração!

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  2. Irônico esse fato da desvalorização da Fender Sothern Cross. Ser fizermos uma pesquisa rápida veremos que a Fender jamais teve fábricas fora do dos EUA e o do México, ou seja: Fender Made In Japan, Indonésia, Chinna, etc, nenhuma delas foi fabricada exatamente pela Fender e sim foram feitas por terceirização. Claro, a fender dá o aval, faz vistoria, exige um padrão mas são guitarras também fabricadas por outras empresas. As primeiras Fender's Japonesas eram feitas pela Tokai Greco e se não me falha a memória também eram feitas pela Ibanez. Mas você não vai ver nenhum fanboy da Fender falando mal das MIJ, dizendo que são Tokai ou Ibanez! É puro preconceito mesmo, falam muito mal da Giannni e muitas vezes sem motivo. Não to aqui dizendo que a Giannini é uma empresa perfeita e maravilhosa: ela teve seus altos e baixos, precisou se adaptar à crises, preços, teve erros e acertos. Mas que, tem muita gente metendo o pau sem conhecimento de causa isso é verdade.

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    1. Pois é Juan, mas nesse caso o preconceito se deve mesmo à falta de padrões das Southern Cross, o que infelizmente as tornam inferiores ás japonesas e até mesmo as mexicanas. Abraços.

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    2. Bom, depende. Pelo menos a maioria dos que criticam a Fender Southern Cross nem fazem ideia da história por trás de Fender MIJ por exemplo. Não to aqui dizendo que uma é melhor ou pior, to falando mais do conhecimento de causa mesmo. Quando alguém diz que o problema da SC é no padrão que eles não conseguiram manter, pequenas falhas de acabamento, etc tudo bem, isso é mesmo verdade. mas quando um sujeito vem chamar a SC de Giannini na intenção apenas de desmerecer a guitarra já sei que esse é só mais um da onda que adorar falar mal de tudo. E esses são os que não fazem ideia de que, Fender fabricada fora dos EUA e do México é tudo na basa de terceirização, concessão, etc. Que as MIJ dos início dos anos 1980 eram top isso não tem como negar, na minha opinião são as melhores Fender's feitas fora do país de origem. Enfim...

      Muito bom teu blog cara! To sempre passando por aqui, vendo novas e antigas postagens, sensacional!

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    3. Tens razão Juan, de fato as SC não podem ser comparadas as Stratosonics da Giannini nesse sentido, embora fossem produzidas pela própria empresa e utilizando as mesmas madeiras, ainda assim, geralmente eram melhores em termos de construção e planejamento. Obrigado por entrar aqui e contribuir com sua opinião e conhecimento! Abração!

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  3. Boa noite Willian. Uma curiosidade! Sobre essa foto da Fender CREME, é uma southernCross? Pois pelo que sei, foram produzidas em apenas 3 cores: Preto, Vermelho e Azul com degrade preto (significava o céu noturno). Sabe alguma coisa sobre outras cores produzidas? A propósito, tenho uma 1993, totalmente original (sem nenhum parafuso trocado), decalque Squier séries (claro). Ela não apresenta folgas, problemas com braço ou escala, e seu Shape é muito fiel à Fender USA (obviamente, pelo que já li, isso foi sorte)kkk.

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    1. Olá Leandro, sim, é uma SC com refinish. Antes ela não era dessa cor, era vermelha. Dê uma olhada nos outros posts do blog sobre as Fender Southern Cross para saber um pouco mais sobre os detalhes e curiosidades desse modelo. Abraços!

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  4. Ola Willian. Existe um relato de 30 dessa guitarras que, por atraso na entrega de partes que foram originalmente pensados em sua fabricação, foram feitas com peças americanas. Vc confirma? Abç

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    1. Impossível confirmar amigo, embora o Carlos Assale tenha afirmado isso em entrevista. Eu nunca encontrei nenhuma, pode ser apenas uma lenda inventada por ele mas vai saber né.. eu adoraria encontrar uma... abraços!

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    2. Olá. Então, tenho uma SC creme com este tipo de captadores e com um checklist escrito em inglês por trás do escudo com os testes OKs dos pickups assinado por Paul. Acho que era dezembro de 94 ou 93, não lembro ao certo agora. Também achei ela ser na cor creme. Será que não fiquei com a creme vendida.. hehe.. Sou de Santa Catariana e tenho esta a uns 15 anos... Penso em trocar os caps. A elétrica já troquei pois a chave seletora e um dos potenciômetros quebraram acho que devido a maresia do litoral.

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  5. sou um felizardo de ter uma SC moon... Um timbre extraordinário, melhor que minha Especial Americana... As ferragens eu troquei e o cap da ponte, eletrica é CTS e muito boa... feliz com ela há 20 anos

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  6. Tenho uma preta de 1994

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  7. Boa noite William! Comprei uma southern cross essa semana e creio que a minha seja uma dessas 30 moscas brancas rsrs. Chave made in usa e captadores diferentões mesmo! Bem altos com uma chapa de metal na base, bem diferentes de alguns que vi em fotos na internet, com aquela duas barras de imãs na base. Você já viu um desses que descrevi?

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    1. Olá. Então, tenho uma SC creme com este tipo de captadores e com um checklist escrito em inglês por trás do escudo com os testes OKs dos pickups assinado por Paul. Acho que era dezembro de 94 ou 93, não lembro ao certo agora. Também achei ela ser na cor creme. Será que não fiquei com a creme vendida.. hehe.. Sou de Santa Catariana e tenho esta a uns 15 anos... Penso em trocar os caps. A elétrica já troquei pois a chave seletora e um dos potenciômetros quebraram acho que devido a maresia do litoral.

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  8. Ah! O timbre é fantástico! Bem diferente das southerns que escutei em alguns videos no youtube

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