quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Raridade do mês: Zeis Stratocaster Prototype #0001


Olá amigos, venho trazer nesse post dedicado à raridade do Mês de Setembro, uma edição produzida recentemente pelo meu grande amigo e renomado conhecedor das Stratocasters Moisés Figueiredo, responsável direto pelo meu interesse nas stratos e por fazer com que eu quisesse aprender mais sobre elas. Apresento para vocês um pouco dessa narrativa, feita pelo próprio Moisés, do protótipo do que chamaremos pelo nome Zeis Stratocaster.

Bem, hoje vou contar um pouco da história e do processo de refinish e montagem de uma strato relic. Desde o ano de 2004, quando ganhei minha primeira guitarra, uma Vantage com Floyd Rose, comecei a me interessar em modificar os instrumentos, a ler sobre circuitos eletrônicos, pedais, amplificadores e etc... Comecei construindo meus próprios pedais, depois meu amplificador valvulado (Bassman), a customizar minhas guitarras e a de meus amigos. Sempre de forma amadora, como hobbie. Com o passar dos anos, depois de poder comprar, vender e trocar várias Fenders, tive a oportunidade de conhecer um pouco sobre o assunto. Por mais que a gente lê, pesquise, sempre se descobre algo novo. E o que mais me fascina neste mundo Strateiro são as guitarras PRÉ-CBS, pelo seu shape, o acabamento em nitro craquelando, captadores em carretel de fibra, fios FORMVAR, escudos amarelados e as ferragens oxidadas pelo tempo. Devido à impossibilidade financeira de adquirir uma legítima Pre-CBS 62/63 e pela facilidade no mundo handmade, resolvi montar minha própria pré-cbs rsrsrs.




Seria muita pretensão de minha parte? Seria... mas resolvi ocupar meu tempo nas férias, feriados e ainda achei o louco do William Martins pra me acompanhar neste projeto. Comecei a garimpar corpos de Strato na internet. O primeiro critério era ser de uma Fender em Alder, mas os preços abusivos me levaram a escolher o corpo de uma Fender Southern Cross em cedro. Discussões a parte se a SC é uma Fender ou não, está neste post, que o William já discutiu. 

Apesar da resistência em deixar a ideia original, por ter um shape um pouco diferente e ser em cedro, eu o escolhi pela a qualidade da madeira. Era um corpo com 20 anos de estrada, a madeira já estava mais que estabilizada.




Após isso iniciei uma nova busca, agora pelo braço. Como a referência era uma Stratocaster 62 tinha que ser um braço em maple com escala em rosewood, ajuste do tensor pelo tróculo e escala com raio 7,25’’. Pesquisei no ML e Ebay, e o alto preço dos braços Fender com essas características me fez mudar de plano novamente e pegar um braço que não era legítimo Fender. Achei no Ebay um braço canadense já usado, por um preço mais aceitável, mesmo assim teve um custo elevado. Nessa altura do campeonato já havia mudado a idéia inicial em dois itens, então tentei caprichar na ponte e tarrachas vintage. Comprei uma ponte Gotoh vintage e uma tarracha Wilkinson, das antigas, exatamente idênticas às Kluson. Muitas Wilkinson’s de hoje são diferentes neste detalhe:


Wilkinson nova

Wilkinson antiga, como as Kluson


Já pra parte elétrica escolhi potenciômetros ALPHA, captadores em Alnico 5, fios de tecido, escudo Fender Standard, chave seletora Fender. Obs: Nesta foto ainda estava sem a chave seletora Fender adquirida posteriormente.





Agora hora de colocar a mão na massa. Como tinha que ser um projeto totalmente feito por mim, iria arriscar a pintura. Não tenho pretensões de me tornar um luthier, mas sim um autodidata pra fuçar meus instrumentos. Tenho meus projetos profissionais na área da saúde que passam longe disso, então essas experiências são como hobbie. Assim, todas as experiências citadas a seguir são minhas, não tem obrigação nem intenção de serem corretas no julgamento profissional dos amigos luthiers.  Por ser experimental, era uma oportunidade de eu aprender as técnicas de pintura, não tinha a pressão em acertar de primeira vez. Pra isso decidi comprar uma pistola de pintura para aprender, treinar e depois pintar a guitarra. Não queria, nem tinha grana para investir muito nisso, então resolvi comprar um equipamento amador e barato. Vi uns vídeos no youtube e achei que seria possível uma boa pintura usando uma pistola pulverizadora, já que a mesma consegue pressão suficiente para formar a névoa de tinta, que permitiria uma aplicação de tinta sem escorrer sobre o corpo. Só aprender a regular o bico e pronto!!! Ela é barata, funcional e de simples uso para pequenos projetos. Não me arrependo, ainda está em pleno uso quando preciso dar acabamentos nos meus pedais handmades. Único ponto negativo é ser de plástico, assim, os solventes de pintura em contato prolongado acaba deteriorando o material plástico do bico. Se fosse metálica seria perfeita pra trabalhos pequenos como este. Então uma dica é colocar os produtos (seladora, tinta e verniz) só no momento em que for usar e logo depois já limpar a pistola.  




FOTO PISTOLA.


Mãos à obra:
Materiais:
- 3 lixas 120
- 3 lixas 220
- 3 lixas 320
-3 lixas 400
- 6 lixas 600
- 2 lixas 1200
- 2 lixas 2000
- Taco para lixar (pode ser feito com pedaço de madeira com borracha na base, 7cmx13cm)
- Pistola Pulverizadora
- Flanelas limpas para limpar os materiais antes de aplicar a seladora, tinta e verniz)
- 300 ml de seladora nitrocelulose Sayerlack (irá diluir, então o volume final será por volta de 500ml)
- 400ml de tinta DUCO branca
- 400ml de tinta DUCO Sonic blue
- 400ml de Verniz Laca nitrocelulose
- 1 rolo de fita crepe para proteger escala do braço e cavidades do corpo.
- Massa numero 2 para polir
- Cera automotiva para polir
- 2 litros de diluente Sayerlack/Thinner (para diluir e lavar a pistola)

Pessoal, o volume de seladora, tinta e verniz é o suficiente pra fazer todo processo e ainda sobrar. Coloquei um volume maior já que se tratava de um teste, então a probabilidade de erros era grande. Esperei chegar as minhas férias pra ir pra casa dos meus pais no interior, pra fazer tudo no quintal mesmo. Como moro em outra cidade e em apartamento isso não seria possível. Assim, a primeira parte foi retirar a tinta original do corpo SC preto. Usei lixa numero 100 até retirar todo o verniz e uma boa parte da tinta. Depois fui pra lixa 220 pra não arranhar a madeira com um grão de lixa grosso, depois lixa 320, 400 e 600 (essa ultima etapa com lixa fina faz com que necessite de menor quantidade de seladora pra tapar os poros da madeira). Não recomendo utilizar removedor de tinta, apesar de ser mais prático e não desnivelar a superfície do corpo, pois restos do produto podem penetrar nas fibras da madeira e atrapalhar o resultado final. Para evitar ondulações na superfície ao lixar, usem sempre um taco de lixar, assim a superfície permanece plana.






Após lixado e limpo, o corpo vai p/ aplicação da seladora. Usei a seladora com base nitrocelulose da Sayerlack, segui as recomendações do fabricante nas porções de diluição. Foram 3 ademãos bem finas até cobrir todos os poros do corpo e 24 horas de secagem completa. Depois usei lixa dágua 600, limpei e parti para o terceiro passo... hora de preparar o fundo branco e a tinta DUCO Sonic Blue. Relic com ar de naturalidade tem que ser feito usando selador, tinta e verniz em nitrocelulose. Assim, fica o mais próximo de uma Fender pré-cbs que eram pintadas com estes produtos. Escolhi no catálogo uma tinta DUCO na cor branca, que não lembro o nome específico, e um azul que achei parecido. Comprei em loja de tinta automotiva, o cara preparou na hora. Comprei 400ml de cada e foi o suficiente, até sobrou. A  tinta ficou um pouco forte, então misturei um pouco da tinta branca para clarear e cheguei à perfeição, na minha opinião.




Dando sequência, apliquei 3 ademãos bem finas do fundo branco e esperei 24 horas de secagem. Depois uma lixa dágua bem leve, numero 600 só pra retirar possíveis defeitos na aplicação do fundo e criar atrito p/ aumentar a fixação com a tinta Sonic Blue, que virá por cima. Esse tipo de coisa não li nem aprendi com ninguém, veio de suposições próprias, então pode não ser o usado pelos profissionais.



Apliquei essa tinta DUCO branca como fundo pra ficar com o mesmo visual das pré-CBS, quando iniciar o relic ele aparecerá.  Dá esse aspecto de degradê, com o amarelado do verniz, Sonic Blue, fundo branco e madeira.




Continuando apliquei 3 ademãos de Duco Sonic Blue, 24 horas de secagem e lixa d’água 600 pra uniformizar a superfície e diminuir a “casca de laranja”. Depois, uma ultima ademão fininha de Sonic blue, 24 horas de secagem, lixa d’água 600 e limpeza.



                                
Partindo para última etapa, aplicação do verniz nitro. Utilizei o verniz Laca Nitro da Sayerlack e segui rigorosamente as instruções do fabricante. Apliquei 3 ademãos de verniz e esperei 24 horas de secagem. Depois iniciei o processo uniformização da superfície, usei lixas dágua 600, 1200 e 2000. Lembrando que nessa etapa, este processo de lixamento é feito utilizando um taco de lixar e lixas molhadas em sabão com detergente. Após isso, inicia-se o polimento com massa de polir numero 2. Haja força nos braços para o polimento...isso cansa muito. Uma politriz elétrica pode te ajudar muito nesta etapa. Depois de polida com a massa numero 2 aplico a cera de polir automotiva. O resultado foi magnífico pra um trabalho amador e utilizando apenas ferramentas simples.




Para o braço apliquei o verniz pigmentado, pois o mesmo já vinha com o logotipo Fender e não queria perdê-lo. Como o acabamento era de nitro, só dei uma lixada com grão 600-1200 para retirar pequenos defeitos e apliquei o novo verniz por cima. Fiz uma camada bem fina pra não ficar com acabamento muito grosso. Depois de seco foi lixado novamente e polido.



Algumas fotos do processo em andamento, ainda sem o relic.







Desde o início do processo de pintura o William Oliveira se empolgou, e me ajudou com tons e códigos de tintas usadas pela Fender. Como ele foi acompanhando todo o processo, ele se apaixonou pelo projeto, até mais do que eu, que estava executando. Então ele começou a me importunar querendo comprar a guitarra quando pronta. Neguei todas as propostas, pois era um projeto pessoal e não profissional. Já tínhamos feitos outros negócios no passado, inclusive tinha vendido uma Fender Standard MIM pra ele em 2012. Mas, sabe aquele cara chato que todos os dias fica te enchendo o saco querendo fazer negócio? Pois bem, ele é assim rsrsr. Acabei desistindo e fiz o compromisso de passá-la depois que termina-la e ficar um tempo com a guitarra pra curtir um pouco. A essa altura do campeonato ela já estava quase pronta, faltavam detalhes, faltava o relic da pintura e do hardware.

Mandei fazer um carimbo com a data em que terminei a pintura e assinei meu nome em todas as partes da guitarra (corpo, escudo e braço), pra evitar que seja vendida um dia como reissue para algum desavisado. Está longe de ter ficado perfeita, mas muita gente não sabe diferenciar nem uma standard falsa, quanto mais uma reissue. Então tentei deixar essas marcas pra não ser vendida como original.




















Combinei com o William que ele nunca desfaça dessa guitarra, mas se algum dia tiver que vendê-la, por motivos de forças maiores, terá que me avisar, pois terei o direito de compra pelo mesmo preço que vendi. Somos de um tempo em que a palavra ainda tem valor, e espero compromisso por parte dele. Amizade tem dessas coisas rsrs. Essa guitarra pode ser identificada como réplica facilmente, só desmontá-la e ver minhas assinaturas, datas, madeira do corpo pelo encaixe do braço e etc. Sem desmontá-la existem pouquíssimos detalhes aparentes que entregam ser uma réplica. E aí, você consegue identificá-los? Comente no espaço de comentários suas impressões. O processo de Relic do hardware, pintura e plastico será descrito em outra oportunidade, já que o texto ficou muito extenso.
Finalizando, fiquei cerca de 2 meses com a guitarra e enviei ao amigo por preço de custo. Hoje o William Oliveira diz ser uma das guitarras preferidas de sua coleção, tanto por beleza, como por tocabilidade e timbre. 

Grande abraço a todos amigos do Blog.

Moisés Figueiredo

4 comentários:

  1. Muito audacioso o projeto, gostei bastante! Um detalhe que eu perceberia que ela é réplica seria as bolinhas da marcação da escala na 12ª casa, as Fender's originais (tanto reissue quanto standart) têm essas bolinhas mais aproximadas entre si. Mas mesmo assim, tá muito bem feito, é uma réplica digna, decente!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado por entrar em contato amigo, pois é.. ela tem esse e vários outros detalhes que a diferenciam de uma Fender, pois ela não é legítima reissue 62,apenas uma réplica. Ainda estou tentando convencer o Moisés de tirar o logo da Fender e colocar um logo personalizado mas tá difícil hehe... Abraços

      Excluir
  2. Sensacional a guitarra e o blog, parabéns! Um dia pretendo fazer um projeto nesse sentido. Espero poder contar com a ajuda dos mestres, parabéns!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado amigo, assim que fizer compartilhe com a gente. Abraços!

      Excluir